Não há dúvidas de que, quando a direção de um banco público como o Banrisul lança um edital para eleição a cargo no seu Conselho de Administração, temos um avanço em relação há tantos anos passados. Aliás, esta é uma reivindicação, luta histórica para dirigentes sindicais de todo o Estado.
Mas, como na reunião da segunda-feira, 4/1, estavam em jogo algumas questões, é preciso ir aos fatos da eleição de CA do Banrisul para que possamos compreender que o banco ainda está mergulhado numa cultura controladora e hierárquica. De novo, louve-se a inciativa, mas que os fatos sejam contados e interpretados como devem ser para que possamos avançar.
A começar pelo dia do lançamento do edital para a eleição. O edital com as regras foi lançado no dia 23 de dezembro. Ora, lançar na véspera de Natal com um prazo exíguo para convocar o processo eleitoral, preparar os candidatos e tirar o nome que será escolhido na Assembleia de Acionistas é complicado.
Como se não bastasse esse problema do período, a reunião da segunda-feira, 4/1, tratou de desfazer um equívoco que o banco estava prestes a cometer. Na verdade, o banco enviou para a representação dos dirigentes sindicais, mais precisamente no mesmo dia da reunião, um arrazoado de sete páginas em que citava várias leis, decretos e resoluções para defender o edital.
A assessoria jurídica do SindBancários, presente à reunião, simplificou o jogo. Em vez das sete páginas, bastava ficar focado em um único artigo de uma lei.
O artigo 17 da Lei 13.303/2016, a chamada Lei das Estatais (Leia a íntegra aqui), motivou a estruturação de uma tese certeira sobre a falha legal presente no edital do Banrisul, publicado no dia 23 de dezembro. A falha foi inclusive reconhecida pelos representantes do banco na reunião temática.
O edital havia sido contestado pela direção do SindBancários, conforme ofício enviado no dia 23 de dezembro, mesmo dia do lançamento. Este documento fora enviado à diretoria do banco e à Fenaban, atendendo-se assim todos os requisitos exigidos pela CCT nacional dos bancários.
O conflito entre cumulativo e alternativo
O conflito criado pelo edital, na verdade, é um lapso ou uma confusão. O banco utiliza um arrazoado de leis para justificar a escolha do perfil possível de candidato e de eleito ao Conselho de Administração. E faz isso, como diz análise da assessoria jurídica do SindBancários, ao transformar “os requisitos alternativos previstos na lei em requisitos cumulativos”.
O trecho abaixo da análise da assessoria jurídica do sindicato é esclarecedor dos motivos jurídicos, do erro (ou falha legal) do Banrisul contido no edital de eleição:
“Portanto, a assessoria jurídica do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região considera que há ilegalidade na segunda parte do inciso III do artigo 12 do regulamento, a qual estipula que, além de dez anos de serviços prestados, o candidato deve, cumulativamente, ter no mínimo, 4 (quatro) anos, consecutivos ou não, exercendo cargo em comissão de nível A1, conforme regulamento de Pessoal do Banrisul, ou cargo de Administrador do Banrisul ou de empresa Controlada do Grupo”.
O fato simplificador é que o banco transformou uma exigência da Lei 13.303, que dá alternativa para o perfil de um candidato ter experiência de quatro ou dez anos, em efeito cumulativo. O banco crava no edital que o candidato tem que ter experiência de 14 anos com os requisitos exigidos.
É claro que essa questão limitaria muito o número de candidatos. E o que se pode falar disso é em cultura. O Banrisul sempre está sob um forte controle do governo vigente. E não seria adequado entrar no Conselho Administrativo, para os gestores, alguém que não fosse da confiança tanto da diretoria quanto do governador.
Isso é do jogo, claro. O que os dirigentes pedem, reitere-se, desde a última semana do ano passado, são esclarecimentos, respostas a mudanças necessárias para que todos possam compreender o processo eleitoral.
É preciso fazer novo edital, mudar os prazos eleitorais e dar tempo para quem tem o perfil e assim o deseje se inscrever. Então, retomar o processo eleitoral em forma mais democrática do que o edital atual contempla.
Os dirigentes não têm motivos para ter interesse em assumir o cargo. A não ser colocar um trabalhador(a) no Conselho de Administração que possa defender os interesses dos quase 10 mil colegas Banrisulenses, a absoluta maioria.
Afinal, como diz o próprio artigo 17 da Lei das Estatais, dirigentes sindicais não podem concorrer a cargo em Conselho de Administração de empresas estatais.
Ter um(a) candidato(a) apoiado(a) pelo movimento sindical é normal. Já ocorre agora na eleição para o Caref, do Banco do Brasil, e para o Conselho de Administração da Caixa, processos eleitorais tradicionalmente democráticos em que todos(as) os(as) trabalhadores(as) desses dois bancos públicos têm direito a voto.
Uma cultura que precisa mudar no Banrisul
Como se costuma repetir na mesa de negociação, há muita cultura a ser mudada no Banrisul. Há muito o que mudar para melhor, como em todos os bancos, diga-se. E uma das urgências é fazer com que gestores cumpram na ponta do sistema (nas agências) o que se negocia e se transforma em norma nos acordos coletivos de trabalho.
As próprias mesas temáticas de negociação permanente são a prova de que há espaço para construção conjunta de soluções que sejam boas para o Banrisul público e para os Banrisulenses. Está mais do que provado que os dirigentes sindicais desempenham papel decisivo ao defender os interesses de seus colegas e do caráter público do banco dos gaúchos e gaúchas.
Ofício pede novo edital corrigido
Na reunião do dia 4/1, os representantes do Banrisul ficaram de mandar repostas sobre as demandas dos integrantes da Comissão de Negociação do Comando Nacional dos Banrisulenses. Desde o dia 23/12, quando o primeiro ofício foi mandado, mesma data da publicação do edital, a mudança nos prazos e a correção da “ilegalidade” apontada são tratadas como necessárias para que o processo eleitoral tenha validade. Estas devem constar em novo edital.
Tanto que, na terça-feira, 5/1, novo ofício, assinado pelo presidente do SindBancários, Luciano Fetzner, (leia aqui) foi enviado à diretoria do banco. Solicita-se, neste último, a publicação de novo edital com as correções pertinentes.
O avanço, em relação à tese dos sindicalistas, é que houve concordância por parte dos representantes da diretoria do Banrisul na mesa de negociação temática, com presença de assessores jurídicos do banco, na segunda-feira, 4/1.
O banco ficou de responder se teria havido erro e apontou dificuldades. O problema agora era o cumprimento de prazos, estabelecidos por órgãos de controle, que o Banrisul precisa cumprir para eleger o integrante do Conselho de Administração.
Processo eleitoral e nova IA
Na quinta-feira, 7/1, o Banrisul publicou em sua intranet Instrução Administrativa (IA) confirmando o resultado positivo da negociação, que informa a suspensão temporária do edital. Segundo os representantes do banco dos gaúchos e gaúchas, faltam ser acertados detalhes técnicos complexos em relação ao texto e prazos, motivo pelo qual o novo edital será lançado na próxima semana, com prazos de inscrição que deverão ficar circunscritos à segunda quinzena de janeiro.
A assembleia de acionistas escolherá aquele que recebeu mais votos ou aquele “com o perfil mais adequado” ao gosto do atual governador do Estado?
Dentro do espírito de mudança cultural, os dirigentes preferem que o escolhido seja pelo voto da maioria em uma eleição aberta e direta. E que tenha assento no Conselho de Administração um(a) colega do Banrisul com experiência de trabalho e dedicação ao banco.
Também deve ter capacidade para sugerir ações que mantenham a estratégia do Banrisul de curto e longo prazo no rumo de seu caráter público e com perfil de defender direito dos Banrisulenses.
De novo, não há dúvida de que é um avanço fazer uma eleição ao Conselho de Administração tão reivindicada pelo movimento sindical há tantos anos. A atual diretoria do Banrisul tem mérito nisso. Mas o processo precisa ser cada vez mais transparente.
O edital não pode ser lançado em períodos que compliquem o processo e o indicado pelo conselho deve sempre ser aquele colega apontado pelo voto da maioria.
Uma das recorrentes frases de representantes do Banrisul, na reunião do dia 4/1, referia que o “eleito pela Assembleia de Acionistas” do banco…
A frase é reveladora, pois mostra que ao final pode não importar o resultado da eleição. Os acionistas, donos de parte do banco, e não aqueles que ralam todos os dias para que o banco seja forte, é quem realmente decidem a vaga, ao menos na visão do que foi legislado.
E mostra também o quanto a cultura do Banrisul precisa seguir caminhando em direção da via mais democrática, onde todos os colegas elejam seu representante no CA. A mudança também depende da força dos Banrisulenses e da negociação em mesa.
O passo está dado. E ele é bem largo.
Como representantes dos Banrisulenses, participaram da reunião: Denise Falkenberg Corrêa (diretora da Fetrafi-RS), Luciano Fetzner (presidente do SindBancários), Fábio Soares Alves (diretor da Fetrafi-RS), Cleberson Pacheco Einchholz (presidente do Sintrafi-SC, de Florianópolis), Ana Maria Betim Furquim (diretora da Fetrafi-RS), Mariluz Carvalho (SEEB Santa Cruz do Sul). E os assessores jurídicos: Milton Fagundes, Antonio Vicente Martins e João Rosito.
Como representantes do Banrisul, participaram da reunião: Fernando Perez (Negociador), Gaspar Saikoski (Superintendente de RH), Paulo Henrique Pinto da Silva e Raí Mello (jurídico).
Fonte: Imprensa SindBancários
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