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Governo pode perder o controle da política monetária do país, alertam sindicalistas


Representantes de três sindicatos dos trabalhadores do BC alertam que PEC que transforma o Banco em empresa pública é armadilha para os servidores e o país

Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 65, formulada pelo atual presidente do Banco Central, Campos Neto, e integrantes da diretoria , que foi apresentada pelo senador Vanderlan Cardoso (PSD/GO), ao Congresso Nacional, traz enormes riscos à independência do BC, aos seus servidores e especialmente à economia brasileira, com a possibilidade de o governo federal perder o controle da política monetária do país, alerta a direção de três sindicatos que representam os trabalhadores da instituição financeira.

A PEC tem assinaturas de apoio de 42 senadores e, em tese transformaria o Banco Central em uma estatal, portanto, uma empresa pública. O que a princípio sempre foi uma defesa do movimento sindical de que estatais são indutoras do crescimento e que servem à população, a proposta de transformar o Banco Central em empresa pública, na verdade, é uma armadilha preparada pela atual direção da instituição que quer alijar o governo federal de decisões econômicas que impactam na vida financeira da população e do país, em geral.

Isto porque com as mudanças previstas na PEC, a instituição deixaria de ser uma autarquia especial, como é hoje, subordinada ao Orçamento Geral da União e passaria a ser empresa pública de direito privado. De acordo com o previsto na PEC essa empresa ficaria livre de se submeter às regras que regem as demais estatais, segundo a Seção Sindical do Sindicato dos Servidores Públicos Federais (Sindsep), no Banco Central. Ou seja, seria uma empresa pública, só que não, pois o banco, diferentemente da austeridade fiscal que prega o seu presidente, ficaria de fora das restrições impostas pela política de controle de gastos do governo. Se a estatal tiver um prejuízo, o Tesouro Nacional vai cobrir esse rombo.

O papel dele também é totalmente diferente de uma estatal, como por exemplo, a Caixa Econômica Federal (CEF), que atende mais diretamente a população, mas também tem autonomia para fazer contratações e mudanças que atendam outros interesses, até pessoais.

Hoje, entre as atribuições do BC, estão o controle da inflação, garantir a solidez do sistema financeiro, sendo o “ banco dos bancos e o banco do governo”. Isso significa que o BC funciona como uma instituição onde os bancos mantêm contas com suas reservas, que são monitoras a fim de garantir que transações financeiras aconteçam, ou seja que assegurem que os demais bancos terão capital suficiente para arcar com seus compromissos.

O diretor jurídico da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef) e membro da Seção Sindical do Sindsep, no Banco Central, Edison Cardoni, detalha como a economia do país e, consequentemente, a população seriam afetadas, caso a PEC seja aprovada pelo Congresso Nacional.

“Se o BC passar a ser uma empresa, mesmo que pública, vai precisar ter lucro para pagar salários e outras despesas. Não foi à toa que recentemente o diretor de uma instituição financeira privada disse que o PIX deveria sair do controle do BC”, diz.

"A PEC 65 abre caminho para tudo, até para o PIX ser privatizado e para a terceirização da administração das reservas internacionais. Ela retira o BC totalmente do controle do Executivo e o Congresso é que faria uma supervisão", Edison Cardoni

O dirigente detalha que a PEC 65 prevê que as despesas do BC como empresa, seriam custeadas com o uso das receitas oriundas do monopólio de emissão de moeda, a chamada senhoriagem. Ocorre que essa receita é tanto maior quanto maior a taxa de juros, assim, o BC poderia ser levado a manter os juros artificialmente altos para obter lucros.

“Tudo isso são coisas da linguagem de economistas e parecem distantes da população, mas cada decisão interfere no seu dia a dia. Uma moeda é patrimônio do povo porque o lucro obtido com o monopólio da emissão de dinheiro e o lucro com os juros altos deixariam de ser incorporados aos recursos da União. Então, o BC não pode se apropriar desse lucro para decidir gastar da maneira que quiser”, argumenta o diretor jurídico da Condsef.

O presidente do Banco Central, na última semana, disse que a taxa de juros, atualmente em 10,75%, deverá começar a reduzir o ritmo de redução e indicou que a taxa irá para 10,25% ao ano em maio e que a diminuição será menor a partir de junho. Entre as suas alegações para manter os juros altos, citada na ata do Copom, é a de que o mercado de trabalho segue aquecido e com aceleração nos rendimentos reais”, como se a responsabilidade do controle da inflação fosse do trabalhador, que hoje tem maiores chances de arrumar um emprego com carteira assinada.

Em nota, o Sindsep diz que a mudança no regime do BC “significa retirar da soberania do voto popular e entregar para um pequeno grupo de pessoas não eleitas a gestão econômica do país, interferindo ilegitimamente no nível de emprego, salários, preços, capacidade de o Estado financiar a saúde, educação, saneamento, segurança pública, enfim, tudo o que constitui o serviço público para a população.

Se por um lado o BC pode ficar com o lucro, por outro, um possível prejuízo seria coberto pelos cofres da União. “Quando dá prejuízo, é o Tesouro Nacional que banca. O povo brasileiro pagaria", explica Cardoni.

Leia aqui a íntegra da nota do Sindsep.

Servidores do BC contra a PEC

Os servidores do Banco Central do Brasil, em assembleia deliberativa com votação eletrônica organizada pelo Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (Sinal), e da qual também participaram o Sindsep e o Sintbacen (Sindicato dos Técnicos), realizada de 26 de março a 2 de abril, optaram pelo voto contra a PEC 65. Foram 74,4% de votos contrários, de um total de 4524 votantes.

Os três sindicatos que atuam no BC, Sinal, Sindsep e Sintbacen indicaram o voto contra a PEC.

Segundo o Sinal, o presidente do banco, Roberto Campos Neto, disse no início de 2023, que proporcionaria diálogo total com a categoria. Contudo, a PEC 65 foi elaborada na surdina, sem debates com os servidores do BC.

O diretor da Condsef também rechaça o posicionamento de Campos Neto que chegou a dizer que os servidores do banco eram favoráveis ao teor da PEC. Para ele, é grave o presidente do Banco Central tomar a iniciativa de produzir uma Proposta de Emenda à Constituição, quando deveria ser feita pelo Executivo Federal.

“Campos Neto está utilizando o cargo que ele tem para impor uma mudança dessa magnitude sem passar pelo Executivo e foi direto para o Senado, fazendo campanha, usando todos os meios que ele tem na mão para poder dizer que a PEC tem que ser aprovada, que ela é importante, e ele está dizendo que os servidores estão comprados para a PEC. É um jargão do mercado financeiro, mas que também tem uma conotação bastante negativa. Exatamente. Por quê? Porque ele está dizendo que precisa da PEC para poder aumentar o salário dos servidores. É muito absurdo”, diz Cardoni.

Os reajustes dos servidores ficariam à mercê das decisões da diretoria, que pode mudar em poucos anos. Já o presidente do BC poderia ter seu salário, atualmente de pouco mais de R$ 18 mil, reajustado para mais de R$ 100 mil, como presidente de uma estatal.

Cardoni lista ainda alguns dos prejuízos que os três mil servidores do BC terão com a possível aprovação da PEC, com ataques a uma série de direitos, inclusive, em situações particulares de previdência social e outros benefícios, como colocar o servidor da ativa em regime de CLT, retirando a sua estabilidade.

Hoje todos os servidores do BC são concursados, exceto a direção que pode ser indicada pelo governo federal. Com a transformação em estatal, o BC poderia fazer suas próprias regras para preencher seus cargos.

Os cerca de 7 mil aposentados também sofrerão prejuízos ao serem realocados para cargos extintos. Hoje muitos servidores aposentados e/ou pensionistas têm paridade de remuneração com os da ativa. A partir do momento que ele for realocado para cargos de outras carreiras do Executivo, eles perderão essa paridade. Por exemplo, um aposentado que tiver seu cargo realocado, digamos, para o Ibama, só terá reajuste quando o servidor daquele cargo também tiver algum reajuste salarial. Portanto ele perde todo vínculo e a paridade com a carreira do BC. Eles também correm o risco de perder o plano de saúde atual.

Cardoni ressalta que para todo problema que o servidor levanta contra a PEC, a direção do banco diz que vai resolver em Lei Complementar, que vai resolver no estatuto da empresa, e em um acordo coletivo.

“Na verdade, a PEC 65 passa o rolo compressor em uma série de direitos com a promessa vaga de resolver em legislação posterior. Vamos supor que tudo isso seja verdade, que tentarão cumprir as promessas, Mas, essa é uma diretoria passageira, daqui a pouco são outras pessoas e quem garante que os outros vão cumprir os compromissos desses que estão aí, uma vez que não vai ter mais a lei que estrutura a carreira, não vai ter mais nada”, alerta o dirigente.

Outros riscos da PEC, segundo o Sindicato Nacional dos Funcionários do BC

A transformação do BC em empresa pública flexibiliza demais os processos do BC (contratações, alienações, etc.) e retira a supervisão do Conselho Monetário Nacional sobre o BC, facilitando o esvaziamento e a terceirização de muitas das atividades da Casa, uma das implicações mais nocivas desse modelo proposto pela mão invisível de Roberto Campos Neto.

A terceirização de atividades do Banco Central do Brasil (BC) pode acarretar uma série de riscos e problemas, indo além da simples redução de custos. Aqui estão alguns aspectos críticos:

  1. Favorecimento a Empresas:

 Terceirizar atividades do BC pode abrir espaço para o favorecimento a determinadas empresas no processo de licitação, levantando preocupações sobre a imparcialidade na seleção de prestadores de serviços. Isso poderia resultar em contratos desvantajosos para o BC e gerar desconfiança quanto à integridade do processo.

  1. Conflito de Interesses:

 A terceirização pode criar situações de conflito de interesses, especialmente se as empresas terceirizadas tiverem vínculos estreitos com entidades financeiras privadas. Esse cenário levanta questões éticas e pode comprometer a independência e a imparcialidade do BC, fundamentais para a integridade do sistema financeiro.

  1. Queda da Qualidade na Prestação de Serviço:

 A busca incessante por redução de custos nas terceirizações pode levar à diminuição da qualidade na prestação de serviços. No contexto do BC, onde a precisão e segurança são cruciais, qualquer comprometimento na qualidade dos serviços pode ter implicações sérias para a estabilidade financeira.

  1. Acesso a Sigilo Bancário e Informações Sensíveis:

  A terceirização pode expor informações sensíveis, como sigilo bancário e estratégias do BC, a terceiros. Isso representa um risco substancial, uma vez que agentes do mercado que têm acesso a essas informações podem usá-las para vantagens comerciais, minando a confiança no sistema financeiro.

  1. Riscos para Segurança Nacional:

Dada a natureza estratégica do BC, terceirizar suas operações pode representar um risco para a segurança nacional. O acesso a informações críticas por entidades privadas, muitas vezes guiadas por interesses comerciais, poderia comprometer a estabilidade econômica e a soberania do país.

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